7 de fevereiro de 2012

Quando os justos perdem a razão: considerações sobre a greve da PM

"Do rio que tudo arrasta se diz que é violento
Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem".
 As Margens - Bertold Brecht


Fui presidente da CUT Bahia durante a greve da PM em 2001, à qual a Central prestou todo o tipo de apoio material e político, além de ter articulado ampla solidariedade aos praças. Vivi o movimento por dentro. Participei de todas as reuniões decisivas, inclusive aquelas das quais participaram o então deputado federal Jaques Wagner e o General Cardoso, Secretário Nacional de Segurança Institucional de Fernando Henrique.
Ainda que não tenha participação direta na greve atual, tenho a sensação de que os governos democráticos que se seguiram ao início da Era Lula, como é o caso da Bahia, não se deram conta de que precisam responder à demanda da valorização do trabalho, cujo crescimento é proporcional ao desenvolvimento econômico. É que este continua sendo um capítulo em aberto, a cobrar medidas efetivas, já que, a despeito do sucesso das políticas sociais e econômicas, das políticas afirmativas e da ascensão social de 30 milhões de pessoas que viviam abaixo da linha de pobreza, não tivemos medidas de impacto no terreno do trabalho nos dois mandatos do presidente Lula e no agora da presidenta Dilma. Oportunidades não faltaram, mas todas elas foram frustradas, seja na redução da jornada de trabalho, sem redução do salário, não votada até hoje, seja no fim do fator previdenciário, aprovado pelo congresso e vetado pelo presidente Lula ou mesmo na recuperação salarial, sobretudo dos servidores públicos.
Diante deste quadro, em que os indicadores do trabalho não conseguem acompanhar os indicadores da economia, e como construtor do atual processo político, me permito dizer que governo democrático que não souber conviver com conflitos sociais, movimentos reivindicatórios e greves, são governos democráticos apenas na superfície. Ainda mais em um estado de gritantes desigualdades como é a Bahia. É inadmissível que se substitua a negociação pela criminalização do movimento, que o diálogo seja substituído pela repressão e o reconhecimento pela indiferença.
Ainda é tempo de o governador, no posto de refundador da democracia republicana na Bahia, com amplo apoio de todas as forças políticas vivas no estado e como hábil negociador que é, trazer o conflito estabelecido para o terreno da luta salarial, ser magnânimo no diálogo, sem abrir mão em nem um milímetro da punição daqueles que provocaram e incentivaram os arrastões e as violências.
É claro que a população vê a greve da PM como nociva, porque traz insegurança e pânico. Porém, esta mesma população não apóia o discurso autoritário, nem as tropas de elites com tanques de guerra e aparato bélico, vindas de outros estados e que aqui chegam como exército invasor, cuja missão principal se transformou em cercar o Centro Administrativo, enquanto os bairros são incendiados, saqueados e interditados pela bandidagem.
Apostar na derrota do movimento pela repressão e punição pode fazer com que os justos percam a razão, sejam os justos que convivem com baixos soldos e humilhações nos quartéis, sejam os justos que receberam do povo a missão de reconstruir a democracia na Bahia.
Negociação e o diálogo são o caminho mais seguro para a solução duradoura do conflito.
Everaldo Augusto foi presidente da CUT Bahia, dirigente nacional da CTB e ex-vereador do PCdoB em Salvador, Bahia.

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