15 de dezembro de 2021

SERRA PRETA: Capina de Monte e seus desafios

Foto: site da Prefeitura Municipal de Serra Preta

Fazer uma grande festa do tamanho de sua tradição é o desafio que os moradores e o poder público têm atualmente. Hoje, dia 15, é a data histórica da Capina do Monte em Serra Preta, 150 km de Salvador. É o dia que os moradores sobem ao monte - as margens da cidade - capinando, rezando e festejando a vida, a liberdade conquistada.

 Embora a data histórica seja no dia 15, as comemorações aconteceram domingo passado, dia 12. Os organizadores acreditam que a realização do evento, todo segundo domingo de dezembro, facilita a presença do público e atrai turistas.

Pode até ser, mas ainda a simples estratégia da mudança de data não foi suficiente no fortalecimento da Capina do Monte. Há cada ano, a festa continua em declínio. Podia ate jogar a responsabilidade do declínio conjuntural a crise sanitária que o mundo vive, mas não é o fator determinante. O descaso pela memória ou mesmo a pouca visão estratégica é o principal fator do enfraquecimento da Capina.

Este ano, a presença de políticos, visando o pleito de 2022, foi mais importante do que o evento em si. Não se viu nenhum compromisso com o futuro da Capina. Por outro lado, as cobranças sociais também são pequenas. Parece não existir uma maldade em manter a festa do jeito que está, mas tudo leva a crer que existe uma omissão em discutir saídas, em valorizar o resgate histórico da Capina do Monte. Quem tem medo da Capina?

A Capina do Monte é centenária, segundo a tradição oral dos moradores de Serra Preta. Não se sabe a data inicial. É uma festa onde o sincretismo religioso é muito presente. O samba e a reza católica ocupam os corações dos apaixonados pela festa. O povo raiz, através da animação da charanga, circula as poucas ruas da cidade. A histórica rua Coronel João Reis, com sua calçada marcante, dá passagem para o ápice do cortejo, registrada nas selfies de quem acompanha.

É uma festa popular afro-brasileira. Serra Preta é uma cidade negra ainda cercada pelo latifúndio. As grandes fazendas dão limites geográficos ao espaço urbano, fazendo de Serra Preta uma das menores cidades do Brasil. Porem, Serra Preta foi elevada a vila em 1722. Feira de Santana, a maior cidade do interior do Nordeste, é de 1831.

Cabe pesquisa, mas tudo indica que o objetivo primordial da Capina do Monte esteja relacionando ao agradecimento e comemoração a à abolição da escravatura em 1888. Serra Preta é a síntese do que foi o Brasil Colonial. Habitada pelos povos originários Paiaias, estes tiveram suas terras invadidas por tropas portuguesas, onde edificaram um engenho que cana-de-açúcar. A partir daí, mão de obra negra escravizada foi trazida como força produtiva. A cidade de Serra Preta é um território quilombola não reconhecido, onde as oportunidades, de toda a ordem, e a justiça social custam a chegar.

Capinar o monte foi a primeira estrada da liberdade em Serra Preta. A libertação vista do alto, conquistada com muita luta e trabalho. O evento se tornou o ato simbólico mais prático da região pela liberdade negra! Talvez, esse simbolismo foi o grande motivo que tentaram, com relativo sucesso, apagar sua riqueza histórica. Apagar a memória de um povo, que contribuiu bastante, mas pouco recebeu. Até hoje, a cidade de Serra Preta sabe pouco sobre o significado da Capina do Monte, que resiste mesmo diante da negação oculta dos poderes constituídos. Mas um dia há de mudar. Vida longa à Capina do Monte.


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