7 de agosto de 2016

Ex-moradora de rua faz história e recebe diploma em cerimônia na Ufba

Ex-moradora de rua, Mona Liza foi aplaudida pelos colegas
ao receber o diploma do curso de História 

(Foto: Almiro Lopes/CORREIO)
Uma trajetória e tanto. A menina que um dia foi moradora de rua vestiu ontem a beca e entrou no salão nobre da Reitoria da Universidade Federal da Bahia (Ufba) para receber o diploma de Licenciatura em História. Mona Liza Nunes de Souza, 28 anos, foi abandonada pela mãe quando nasceu e criada por uma avó que não a amava e a maltratou até os 9 anos. Em fevereiro de 2011, quando ela foi aprovada no vestibular, o CORREIO contou a sua história. (Na época, comentamos a boa matéria do Correio da Bahia)
Quando a mãe reapareceu trazendo com ela outras duas crianças, Mona achou que ficaria segura. Mas o segundo capítulo dessa história não seria menos doloroso. Ontem, ela foi a única formanda aplaudida de pé pelos colegas e por um auditório lotado. Nos últimos anos, as despesas de Mona foram com livros e xerox.  Acordava às 5h para ir às aulas. À tarde, ia para o estágio no Arquivo Público do Estado e depois voltava à faculdade. 
Há três anos, deu à luz  pequeno Lucas e precisou administrar os estudos com a maternidade. Ela conta que sofreu preconceito por ser negra e pobre, mas nada a fez desistir do sonho do curso superior. “Chegava em casa por volta das 23h, cansada. Fazia a comida do meu filho e me preparava para o dia seguinte. Foi difícil, mas está provado que não era impossível”.
Quando chegou em Salvador, ainda criança, ela sobreviveu nas ruas, através de esmolas. Dormia no papelão e esperava o “carro da sopa” para ter o que comer. Viu a mãe e as irmãs se renderem ao crack. A vida lhe negou casa, comida e, o que mais lhe fez falta, amor.
“Foram desafios dos mais simples aos mais complexos, como a fome e a falta de amor. O mais essencial na vida de um ser humano me faltou. Vencer foi muito difícil”, contou. 
Por duas vezes a família teve a oportunidade de deixar as ruas, mas a mãe vendeu as casas que recebeu em programas sociais para permanecer no mundo das drogas. Inconformada com a realidade que vivia, Mona matriculava-se em escolas públicas, escondido da mãe, que considerava o estudo desnecessário. Aos 15 anos, conseguiu um emprego como ajudante de cozinha de um restaurante. Ganhava R$ 15 por dia. 
Mona teve outros dois empregos antes de entrar na faculdade. Trabalhava das 6h às 19h e corria para escola, no Santo Antônio Além do Carmo. Foi lá, no Colégio Estadual Marques de Abrantes, que conheceu o esposo, Welson Pereira, 32. Ele largou os estudos para ser sorveteiro. O casal juntou o dinheiro que tinha, comprou um freezer e uma máquina de fazer sorvete. “Ela é uma guerreira, passou por muita coisa para chegar até aqui. Tudo o que eu posso sentir nesse momento é orgulho”, disse o marido.
Ela cursou o 2º grau nos colégios Central e no Iceia. Depois, fez cursinho e entrou na Ufba. Mona tentou dar outra oportunidade à mãe e às irmãs. Convidou para morar com ela, mas acabou sendo roubada pela própria família. A mãe morreu há três anos, em uma clínica para soropositivos. Uma das irmãs continua entregue ao crack, enquanto a outra não dá notícias há anos. 
A história que Mona reescreveu terá  um novo capítulo. Ela foi aprovada para o Bacharelado em História. “A maior arma do opressor é a mente do oprimido. Eles falam tanto que a gente não pode, que não somos capazes, que a gente acredita. Isso precisa mudar”.

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