Serão reservadas, no mínimo, 30% das vagas ofertadas |
Todos os processos
seletivos para os cursos de pós-graduação stricto sensu da Universidade Federal da
Bahia (doutorado e mestrados acadêmicos e profissionais) irão adotar o sistema
de cotas: serão reservadas, no mínimo, 30% das vagas ofertadas para candidatos
negros (pretos e pardos) e uma vaga a mais em relação ao total ofertado nos
cursos para candidatos enquadrados em cada uma das categorias de quilombolas,
indígenas, pessoas com deficiência e trans (transgêneros, transexuais e
travestis).
O sistema de
reserva de vagas foi aprovado na forma de resolução na manhã da quarta-feira,
11 de janeiro, no Conselho Acadêmico de Ensino (CAE), órgão que delibera
sobre vagas para ingresso tanto na graduação quanto na pós, e já começará
a valer para as seleções do segundo semestre de 2017.
A ação afirmativa,
segundo o reitor João Carlos Salles, tem o objetivo de aumentar a participação
de grupos sub-representados na comunidade acadêmica. “A resolução, associada às
outras iniciativas de nossa Política de Ações Afirmativas, busca avançar na
correção de desigualdades históricas, tornando a UFBA plena em sua vocação inclusiva”,
disse.
Na visão do
presidente do CAE, professor Francisco Kelmo, “mais que reparação, a
resolução é oportunidade”, porque ela traz a possibilidade de pessoas que
sempre foram excluídas mostrarem sua capacidade. Professor do Instituto de
Biologia da UFBA, Kelmo lembra que as novas cotas representam uma continuidade
ao acesso já oferecido pelas cotas da graduação, que permitem o ingresso na
universidade de muitos que têm um forte desejo de crescer intelectual e
profissionalmente, mas são barrados pelo racismo e pela discriminação.
“Agora, essas pessoas poderão ter acesso aos programas de pós-graduação e
mostrar também aí que são capazes”.
“A UFBA vai além
das definições da Portaria Normativa nº 13, de 11 de maio de 2016, do
Ministério da Educação, que contempla apenas negros, indígenas e pessoas
com deficiências e torna-se a primeira universidade do Brasil a preocupar-se,
também, com a inserção na pós-graduação de quilombolas e trans”, disse o
coordenador de ensino de pós-graduação da UFBA, Ronaldo Lopes Oliveira, que
presidiu comissões especiais sobre o tema. Depois de consolidadas as cotas para
a graduação, trata-se de ampliar a incorporação na Universidade da população
que, no seu dia a dia, lida com demandas especiais, questões étnico-raciais, de
origem e de identidade de gênero.
Processo de construção
A UFBA, segundo
Oliveira, está aprimorando e ampliando sua política de ações afirmativas.
“Houve a preocupação com o estabelecimento de uma política de ações afirmativas
com cuidado para que a reserva de vagas seja o piso e não o teto. O percentual
mínimo da oferta total de vagas para negros e pardos baseia-se na proporção
desta categoria na pós-graduação no Brasil hoje, que é de 28,9%. Por isso,
adotou-se o mínimo de 30%, reservados para negros e pardos como ponto de
partida na UFBA”.
Desde 2014, o
processo de discussões que levou à adoção do sistema na pós-graduação foi
marcado pelo diálogo com os movimentos sociais e vários grupos da universidade,
por meio da realização de debates públicos como o que reuniu no auditório da
Faculdade de Arquitetura, no final do ano passado, convidados especialistas no
tema, como os professores Kabengele Munanga, da Universidade de São Paulo
(USP), José Jorge de Carvalho, da Universidade de Brasília (UnB), Maria Rosário
Gonçalves de Carvalho, dos Programas de Pós-Graduação em Antropologia e
Multidisciplinar em Estudos Étnicos e Africanos (Pós-Afro) da UFBA, e Samuel
Vida, da Faculdade de Direito da UFBA, representando também o Coletivo Luiza
Bairros.
Além disso, a construção
dessa resolução passou pelo debate com coordenadores de pós-graduação, pelas
congregações das unidades acadêmicas, além de grupos e movimentos sociais
mobilizados pelo tema, tais como o Coletivo Luiza Bairros, a Unegro, a
Associação de Pós-Graduandos (APG/ANPG) e demais movimentos organizados que
impelem o tempo todo a Universidade a se refletir e buscar refletir em seu
tecido a sociedade em que está inserida. Varias questões foram levantadas a
partir da contribuição de unidades de ensino como Educação, Química,
Matemática, Saúde Coletiva, Instituto de Humanidades, Artes e Ciências (IHAC) e
Medicina Veterinária e Zootecnia, e foram debatidas pelas comissões especiais
que trabalharam na Resolução.
A professora
Bárbara Carine, do Instituto de Química, membro da Comissão do CAE e do
Coletivo Luiza Bairros, disse que “a aprovação das cotas na pós-graduação
é uma conquista, fruto da luta de grupos minoritários do país e da UFBA, cujo
início pode ser datado nos idos dos de 2005, momento em que houve a implantação
de cotas para a graduação”. Para ela, “o impacto irá além da
representatividade quantitativa da diversidade populacional acadêmica e se
evidenciará também qualitativamente, nas linhas de pesquisa, pois esses
sujeitos poderão estudar temáticas relacionadas às suas próprias questões, indo
na contracorrente do que acontece, predominantemente, nos ambientes acadêmicos
hegemônicos”.
Já segundo o
pró-reitor de Pesquisa, Criação e Inovação da UFBA, Olival Freire, a UFBA está
aprimorando medidas que garantam a permanência e inserção no ensino, na
pesquisa e na produção cientifica de segmentos sub-representados dapopulação.
Porém, é mais do que isso, ele disse. “Estamos criando as condições para a
construção de uma ciência que incorpore saberes e perspectivas epistemológicas
diversas, aproximando-a, assim, dos nossos problemas, do nosso cotidiano, da
vida como ela é, em sua diversidade e complexidade”.
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